Bogoshipo - Das flores em branco



Dedilho agora palavras regadas a lágrimas; dentre elas: flores incapazes de florescer e um amor imortal. Dedilho agora em uma pequena folha branca de papel as memórias que ainda sou capaz de transmitir.

Apenas me resta uma folha em branco. As outras furiosamente jazem nos chão. Algumas em pedaços, outras em grandes bolas amassadas. A folha em branco precisa ser preenchida, assim como minha memória.

Mas por que sinto que já não tenho mais nenhuma?

As pessoas aqui me dizem que há alguém lá fora que me ama, mas elas não me contam quem. Pouco arrisquei a citar nomes que martelam sobre minha mente... Alguns não fazem sentindo. Enquanto teclava por entre as letras empoeiradas, tentando criar uma conexão, sentia meu peito aquecer, levando o calor por entre meus dedos trêmulos e nervosos.

Das vozes que existem em minha mente, a que fala mais alto é a tua. Entretanto, ao contrário das outras, esta é a mais agradável. Talvez ela seja inaudível para as outras vozes, pois elas conversam entre si na minha mente, tentando confundir o que é real e o que é imaginário, mas não conversam com você.

Eu me lembro de você.

Lembro-me de tuas mãos acariciarem meu rosto antes de nos entregarmos a uma dança em teu jardim, o qual chama de cama. Que sortudo, eu, dormir e acordar em teu paraíso de descanso diversas vezes; e ainda ter a visão de teu rosto apoiado sobre o travesseiro. Teus lábios amassados e redondinhos suplicam por um beijo quanto está nessa posição.

Ainda me recordo de momentos em meio a folhas de outono. Secas. Que estralam a cada passo. Olho para a cicatriz próximo ao meu cotovelo, eu ainda sinto a dor. Ainda lembro-me do tombo e do que um passo em falso me causou. Não é só lá que dói, eles me dizem que minha cabeça também sofreu, mas eu procuro pela minha pele e não encontro.

A memória que mais gosto é de meus braços aninhando teu corpo frágil e cansado. Você talvez não saiba, mas eu tentava te proteger. Quanto mais perto, melhor, eu pensava. Eu tinha a leve impressão de que conseguiria te guardar dentro de mim, não necessariamente em meu coração, mas colocar-te dentro de meu ser me parecia ser uma boa ideia para te proteger.

Mas agora sinto: é você que me protege. São as memórias que tenho de sua face, seu sorriso, seu corpo, que me fazem acreditar, que me levam para um lugar que eu ainda não tinha acesso e era desconhecido.

Meu eu.

Você é real. Eu posso dizer com exatidão que é real. Assim como é real o pulsar de meu coração. Você existe.

Eu dedilho sobre a folha, buscando ainda alguma memória falha, mas é difícil. Parece que parte de mim esquecida está com você.

Onde você está a não ser em minha mente?

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