Um buquê para você



Não sei se vou me afogar em tristeza, risadas ou flores. Só sei que minha garganta dói, pois não é capaz de abrigar tantos sentimentos unidos pelo nó da decepção amorosa.
Você se foi e, mais uma vez, a estúpida sou eu. Como se eu já não tivesse aprendido a lição no meu último relacionamento. Eu sabia que não daria certo, porém insisti e imaginei que talvez (só talvez, uma exceção sequer) poderia ser diferente.
Poderia ser melhor. Ter um final feliz; ou sequer ter um final.
E então você se foi. Deixou tudo o que era nosso e partiu. Eu vi seu corpo me dar as costas e não fui capaz de fazer nada, nem ao mesmo levar minha destra até seu ombro e implorar para você ficasse. Não. Eu não sou corajosa o bastante para dizer o quanto tu és importante pra mim... e por engolir tantos sentimentos, agora estou vomitando flores.
"Droga!".
Foi a primeira reação que tive ao vomitar uma pétala de tulipa amarela. Pensei estar delirando por um momento, mas não. Eu senti a pétala roçar por entre minha garganta e me deixar com ânsia. Ela até ousou em dançar na minha língua antes de sair de dentro de mim em meio a um filete de saliva amarelada.
Doente de amor. Literalmente. Só restava minha doença, as pétalas (que não paravam de sair, céus) e um coração partido que tentava se "juntar" com raízes dessa tua flor estúpida. A tua favorita.
Eu sabia o que deveria ser feito para parar de vomitar pétalas de tulipas. Há uma cirurgia capaz de destruir todas essas raízes e também as memórias que nosso relacionamento deixou. Meu coração seria curado, revitalizado e pronto para amar novamente, mas... de verdade? Eu não estava interessada em médicos rasgando meu peitoral a procura do coração mais sofrido do universo. A ideia de ter raízes crescendo dentro de si é tão ridícula, eu não queria passar pela cirurgia.
E enquanto eu decidia ou não se seguiria em frente em virar flor, eu vomitei uma tulipa inteira. O caule arranhou minha garganta e eu só pensava em cuspi-la o mais rápido possível. Foi a primeira vez na vida que eu vomitei sangue; eu chorei minha alma toda.
Estava assustada. Quero dizer, desde o começo eu me assustei, mas já havia me acostumado a viver rodeada de lindas pétalas amarelas. Afinal, elas me lembravam você.
Eu amava nosso relacionamento.
No início dele.
Você parecia ser a única chance de me ajudar com as feridas do passado. Seus dedos gélidos eram o contraste perfeito para minha pele sempre quente. Teu riso soava como melodia para a minha risada meio murcha; meio muda. Eramos opostos, mas as diferenças nos transformou em encaixes perfeitos, indispensáveis e viciantes.
Pelo menos eu tinha essa visão.
Para você eu era apenas um passatempo; um beijo bom. A garota que contava piadas bestas e que era capaz de arrancar gargalhadas tão extravagantes que incomodavam os vizinhos. A garota que não sabia cozinhar e que te encantava com a bagunça feita na cozinha. A garota que te enviava textos na madrugada para você acordar feliz. Ou eu não era nada disso. Eu era apenas um garota da qual você gastava sua saliva e preservativos baratos.
Eu continuo sendo essa mesma garota. É por isso que você não vai voltar.
Diariamente minha garganta me presenteia com uma tulipa inteira. Resolvi então plantar meu jardim. Não é incrível? Ninguém me trás flores, então estou plantando as minhas próprias. Não quero ser dramática ao dizer que rego a terra com minhas lágrimas, mas é a mais pura verdade. As flores não sabem o que são as lágrimas, pois elas se misturam com o regador velho e empoeirado que encontrei nos fundos do quintal; mas eu continuo chorando sobre elas.
Todos os dias. Durante o por do sol. Eu enterro uma tulipa na terra e choro. São lágrimas de arrependimento por ter me entregado demais. São lágrimas de solidão. Lágrimas de dor.
Dizem que meu últimos momentos de vida terá a companhia de um buquê; o qual eu vou expelir. Após isso será o meu fim.
Morrer de amor parecer ser tão belo e tão poético. Talvez seja por isso que o hanahaki¹ existe. Entretanto, não é tão bonito assim... não quando é você que tem sua garganta arranhada pelas flores favoritas do amado.
Você deixou tanto sentimento dentro de mim, mas também tanto vazio que meu corpo não viu outra opção a não ser encher de flores para preencher os buracos, mas o amor é burro, ele erra e ao invés de ajudar só atrapalha. Por que foi preencher as partes solitárias com suas flores preferidas?
Eu odeio tulipas.
Eu odeio você.
E odeio ainda mais não conseguir me libertar desse sentimento. Talvez esse seja meu castigo e, de quebra, você ainda ganha um buquê.

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¹ hanahaki é uma doença literária, onde o indivíduo sofre de amor unilateral e após ter o coração partido, flores começam a crescer dentro de si.
a príncipio vomita-se as pétalas das flores favoritas da pessoa amada. em seguida, vomita-se uma flor por inteiro. e por último, um buquê; este último estágio leva a morte.
há duas formas de se livrar da doença: fazer uma cirurgia no coração e retirar todas as flores, porém com ela se vão todas as memórias da pessoa amada.
ou morre-se de amor. literalmente.

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